quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Sabe o planeta Netuno? Está a 4 bilhões de quilômetros e nós conhecemos a composição da sua atmosfera. Se você não acha isso maravilhoso, eu tenho pena de você.

  O filósofo francês Auguste Comte (aquele do positivismo) disse, num dia gelado de 1835, que a humanidade nunca saberia qualquer coisa sobre a atmosfera dos corpos celestes ou sobre sua constituição interna. Estaríamos, neste aspecto, condenados à nefasta prisão da ignorância.
  Comte estava prestes a ser desmentido: nos próximos anos o astrônomo inglês William Huggins construiria espectroscópios e telescópios, o que lhe permitiria analisar a luz proveniente de corpos celestes e daí obter informações sobre eles. Em 1869, Huggins usou a teoria de Doppler para determinar a velocidade radial da estrela Sirius a partir do espectro que ela emitia (isto mesmo: a partir da luz que a estrela emitia, ele calculou a sua velocidade, numa época em que nem o xampu tinha sido inventado! Como pode haver gente que não se interesse por isso?! As pessoas deveriam conversar sobre isso o dia inteiro!)
  Estou em dificuldades em imaginar o que posso escrever aqui sem molestar o leitor. Vejamos:
  1 – Os átomos de cada elemento químico têm um número determinado de elétrons, distribuídos de determinada maneira em “camadas”. Por exemplo: o sódio (Na) tem 11 elétrons, 2 dos quais estão na primeira camada, de energia mais baixa, 8 ocupam a segunda camada e 1 elétron fica na terceira, de maior energia. Cada camada é dividida em subcamadas ou níveis, nomeados s, p, d, f, g...
  2 – Os elétrons podem absorver luz de certas cores, mas de outras não. O que determina as cores que eles podem absorver é a diferença entre as energias dos níveis eletrônicos. Exemplo: um elétron num átomo de sódio pode pular do nível 3s para o 3p se absorver uma energia de 2,1 eV. Isso corresponde à absorção de luz amarela.


  3 – Os elétrons vão e voltam aos níveis eletrônicos. Quando voltam, emitem luz da cor da que haviam absorvido. Um espectroscópio pode separar essa luz em cores para serem observadas em uma tela. Esta figura é o espectro do sódio (note a cor amarela):

  4 – É possível examinar o espectro da luz solar refletida por um planeta específico. As cores ausentes são pistas que indicam que estão presentes na sua atmosfera elementos ou compostos que absorvem aquelas cores. Por exemplo, se cores correspondentes ao metano estão presentes no espectro do Sol mas ausentes no espectro do planeta, isto indica que a atmosfera do planeta contém metano, que absorveu a cor que falta. A análise da intensidade de cada linha do espectro fornece informações sobre a concentração de cada substância. Contemple agora toda a glória do espectro de Netuno:




  Comentário importante 1: Claro que eu escrevi aqui numa linguagem bem grosseira, pensando naquelas pobres pessoas que têm dificuldade em enxergar beleza na Ciência. Naturalmente, essa linguagem pode ser gravemente ofensiva a qualquer estudioso mais sério.
  Comentário importante 2: Se eu fosse você, não usaria esse texto na sua feira de Ciências. Tenho excelentes referências, terei prazer em indicá-las a quem se interessar.



sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Sobre a hipocrisia do texto anterior Ou: Uma crítica de mim por eu mesmo

(queira ver o post anterior, sobre o martírio; este texto é um acréscimo àquele)
  Na última vez que meu espírito, perturbado, se decepcionou com Deus, eu estava numa fila de supermercado (sim, às vezes eu me decepciono com Ele; mas na maioria das vezes a crise é breve e a gente acaba fazendo as pazes logo).
  Pois bem: na última vez que me decepcionei com Deus estava, para ser mais específico, na fila das Lojas Americanas para comprar o meu lanche da tarde. Uma mulher muito velha e pobre estava tentando fazer compras, mas talvez tenha errado nos cálculos: não tinha dinheiro suficiente para levar tudo e precisou devolver quase metade do que tinha posto no carrinho. Senti uma pena, uma pena!...
  Ela foi embora levando duas ou três sacolinhas de plástico; muitas outras pessoas passaram pelo caixa e pagaram seus itens; chegou a minha vez e eu paguei com o cartão de crédito; sentei num banquinho para saborear o meu lanche – e durante todo esse tempo estava pensando na velhinha e em toda a fome que há no mundo, culpando a Deus pela injustiça social e tantas outras misérias humanas.
  Quando decidi parar de pensar nisso para apreciar melhor minha merenda, uma questão óbvia me veio à mente: por que é que eu não tinha feito nada para ajudar a velhinha? Aliás, por que é que eu nunca fazia nada? Talvez pudesse ter ajudado a mulher, mas em vez disso estava ali comendo batata Pringles e tomando Coca-cola (vide ilustração)

  Então concluí que talvez eu não fosse tão altruísta quanto imaginava. Olhando para a questão agora não posso deixar de obter a mesma conclusão. Todas as vezes em que ajudei alguém (falando em termos práticos, isto é, em dinheiro) a quantidade nunca era tão substancial a ponto de me fazer falta. Nunca era uma “oferta sacrificial”, para usar o jargão evangélico. Nunca abri mão de algo que desejava muito para favorecer a outra pessoa mais necessitada. A minha última oferta para Missões Estaduais foi vergonhosa. Gozo de perfeita saúde, mas nunca doei medula óssea. Apesar de freqüentemente passar em frente ao Hemoce, nunca doei sangue. Em vez disso eu fico teorizando sobre a inação de Deus enquanto me empanturro de carboidrato e ácido fosfórico.
  E aí eu fico escrevendo no blog essas coisas sobre sofrer pelo inimigo e o martírio dos santos e a Religião mais Excelente e blábláblá. Deus me tenha piedade.

  Comentário Importante 1: Não retiro nada do que escrevi no texto anterior. Não é só porque eu sou um hipócrita que você não deve dar atenção ao que eu digo.
  Comentário Importante 2: Eu não sou um hipócrita. Acredito mesmo no que prego, percebo que minhas palavras condenam a mim mesmo e estou disposto a reavaliar algumas prioridades. Tomei algumas resoluções a respeito disso, as quais pretendo compartilhar com os amigos mais próximos.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Primeiro post com conteúdo cristão: Você, crente, pode – e deve – ser um mártir. Por que nos esquecemos da bendita idéia do martírio?

  Os donatistas, membros de uma seita cristã do norte da África, eram tão obcecados com a idéia do martírio que abordavam estranhos pedindo-lhes que os matassem. Como os estranhos eram ameaçados de morte se não concordassem, o martírio era bem fácil para os donatistas.
  Uns dezesseis séculos já se passaram e agora talvez não haja cristão nesse mundo que simpatize com a idéia do martírio (o que é que dezesseis séculos não fazem!). Bem, eu acredito que, se Jesus não estimulou diretamente a prática do martírio, com certeza os seus ensinamentos trazem uma ideia que se aproxima bastante disto.
  Não é que Jesus tenha ensinado a amarmos o nosso semelhante sem esperar nada em troca. Confúcio e o rabino Hillel é que fizeram isso. Cristo foi muito mais longe: disse que deveríamos amar os nossos inimigos! Argumentou ele: “Se vocês só amarem os que lhes amam, qual é o prêmio que merecem? Ora, grande coisa! Até os deputados fazem isso!” (Mateus 5.46, paráfrase)
  Aguentar que lhe plantem a mão nos beiços talvez seja fácil – difícil é esperar pela segunda bofetada. Entregar seu celular ao assaltante é fácil – difícil é dizer “amigo, tenho algo aqui que vale mais!”, e deixar que ele leve também a sua bíblia. Acompanhar aquela sua tia resmungona até a casa dela é fácil – difícil é andar a segunda milha com aquele que lhe agride (vide ilustração).



  Sofrer pela fé é visto como algo nobre em diversas religiões, mas sofrer pelo inimigo – certamente a versão mais louca do martírio – é algo bem típico da religião de Cristo. Uma ideia tão pouco lucrativa que ninguém levaria a sério se Ele mesmo não tivesse se doado como exemplo: porque Ele nos amou quando ainda éramos inimigos.

  Que nós possamos enxergar o quanto estamos distantes da religião de Cristo e que paremos de reclamar quando sofremos por nós mesmos ou por aqueles que amamos – pois tínhamos que nos ocupar é de sofrer por nossos inimigos!

sábado, 15 de outubro de 2011

Primeiro post sobre física: A espetacular ilusão de ótica da Sala de Ames


Quando falei do blog à minha amiga Samara, ela perguntou, não sem tentar me induzir à resposta que queria ouvir:
 - Ah, um blog? E vai ter o quê, curiosidades?
Bem, não ia ter curiosidades, não até ela perguntar. Mas não sei como ainda não tinha pensado no mais óbvio: escrever sobre assuntos que me interessam, como física. Eis, então, a primeira postagem com uma curiosidade sobre física, dedicada à Samara. Como eu me lembro de uma vez em que ela disse que adorava ilusões de ótica (ou será que não foi ela? ou será que não era de ilusões de ótica que ela disse gostar? bem, agora não importa), gostaria de mostrar a vocês um fantástico dispositivo: a sala de Ames, concebida pelo oftalmologista americano Adelbert Ames em 1935.
Trata-se de uma sala de formato trapezoidal que é construída para criar uma ilusão de ótica para um observador que enxerga a sala por um pequeno orifício. Para o observador, ela parece uma sala convencional retangular, mas na verdade uma de suas paredes tem forma de trapézio, sendo que um dos seus cantos fica bem mais próximo do observador do que o outro. Desta maneira, um objeto colocado num dos lados da sala parece gigante, enquanto o outro parece minúsculo, mesmo que os objetos tenham tamanhos iguais. Na foto acima, uma alegre menininha se coloca nos dois cantos em uma sala de Ames.

Aqui está um esquema do funcionamento de uma sala de Ames (não lhe lembra suas aulas de ótica geométrica?)

Note que os ladrilhos do chão – que parecem quadrados, mas só parecem* – são fundamentais para o efeito. Aliás, nem as paredes nem o teto são necessários para criar a ilusão: um horizonte desenhado adequadamente é suficiente para forçar o cérebro a readaptar sua percepção de profundidade.

Este efeito tem sido usado até em grandes estúdios de filmagens! Na trilogia O Senhor dos Anéis, por exemplo, os hobbits parecem menores que os humanos graças a esse truque :-).
O vídeo abaixo ilustra de maneira dramática a vida numa sala de Ames. Não é incrivelmente convincente essa ilusão?

*Os ladrilhos parecem quadrados, mas não são. Isso até parece uma descrição da minha avó Chichica, que é bem menos quadrada do que aparenta (no sentido de careta, claro). A diferença é que os ladrilhos do chão não me enchem o saco perguntando por que é que eu não consigo arranjar uma namorada.


Primeiro post sobre música: Sérvios, coreanos, noruegueses e mexicanos, unidos por um mesmo - e brasileiríssimo - som

Bossa Nova Around the World: Esse cd foi a causa de esse blog ter emergido à existência.
Foi-me presenteado pela Claudiana, apesar de o aniversário ser dela: agora estou me perguntando como é que fui eu que acabei sendo presenteado.
Bem, eu gosto muito quando artistas estrangeiros se interessam pela cultura brasileira, me sinto como se estivessem a fazer uma homenagem a mim. 
Sabe quando toca aquela música que você adora na rádio e você, emocionado, põe no volume mais alto e fica tentando cantar? Você tem a música no seu MP3 e age como se nunca a tivesse ouvido antes! É que parece que aquela canção foi dedicada a você, já que ela lhe é tão cara. Pois então: é mais ou menos esse o sentimento que tenho quando ouço artistas estrangeiros cantando bossa nova.
Bossa Nova Around the World é uma reunião de 12 artistas de várias nacionalidades tocando a genuína música brasileira. Agradam-me especialmente: Jardin D'hiver, composta pelo israelita Keren Ann e aqui docemente interpretada por Bïa, franco-brasileira; Melancholisch Schön, do grupo alemão 2raumwohnung; Menina Moça, que começa com uma flauta de forró antes de seguir com uma batida de bossa e jazz, pelo trompetista sérvio - sérvio! - Dusko Goykovich; e Vakker Natt, que é uma versão em norueguês da tão célebre Corcovado interpretada por uma das principais vocalistas de jazz daquele país, Hilde Hafte.
O álbum é delicioso e quem gosta de bossa nova deve se sentir obrigado a conhecê-lo. Está disponível para download na rede, graças a Deus: o meu CD está arranhado e eu teria perdido quatro faixas não fosse isso. Claro que eu posso baixar para ouvir o álbum, já que eu paguei por ele (ou melhor, a Claudiana pagou); você está convidado a pagar por ele também, como nos mandam as regras de civilidade.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Primeiro post de 'humor' geek: Triste Aula de Cálculo

Não poderia deixar de postar aqui a tirinha que fiz para um site de humor geek de que gosto muito, o SpikedMath. Ele faz piada com jargões matemáticos e vida acadêmica, e é portanto bastante original. Eis a tirinha:




Atendendo a sugestões dos meus amigos Jônatas e Lídici, ponho aqui uma versão em português. A tirinha original, com erros de inglês e tudo, vocês podem ver aqui: http://spikedmath.com/451.html.

Começo, Estreia, Prelúdio

  Como disse há pouco à minha amiga Claudiana, que bom! que agora tenho um espaço para divulgar minhas opiniões.
  Conhecem a angústia de ter uma ideia tão forte (e às vezes tão negra) que parece não caber dentro de vocês, e que incomoda até que seja exposta ou compartilhada? Pois sim.
  Atenção! Aqui não há qualquer garantia de qualidade. Disse que as ideias incomodavam, que eram fortes e escuras, e não que eram boas. Já tive uma verruga genital com essas mesmas características, e posso garantir que ela não passaria por nenhum teste de qualidade*.
  Feitas essas primeiras observações, para mim absolutamente necessárias, tenho o prazer de convidá-los a ouvir minhas ponderações verruginosas. Acredito que é mais apropriado que o primeiro post seja algo positivo, então publicarei assim que algo bastante agradável me vier à mente. 
 Até lá!


*Naturalmente, isso foi há muito, muito tempo, quando ainda corria pelado pelas ruas quentes de Itapipoca. Desde lá, as verrugas pararam de me atormentar, ao contrário dos pensamentos.